Uma vez por dia


Uma vez por dia, religiosamente, ela levantava-se do confortável sofá e apanhava, da estante, uma caixa entalhada em cedro, repleta de pequenos orifícios.
Cuidadosamente, retirava dali a víbora, que a picava sempre no dedo indicador, sem deixar vestígios. Entregava-se então ao prazeiroso torpor daquele veneno, administrado em doses homeopáticas, que promovia nela, tenues transformações.
Deu-se por satisfeita no dia em que, ouvindo as costumeiras reclamações do companheiro, exibiu toda a sua impaciência, chacoalhando, irritada, os sonoros gisos que se lhe afloraram na ponta dos dedos.
(Ludmila)

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