Lembro-me


Amigos, pensei muito se publicava essas correspondências, ou não!
Mas elas me tocaram de uma forma tão profunda, que resolvi partilhá-las com vocês!
Obrigada, meus tão queridos, por todo esse carinho, que aceito e agradeço!
Grande beijo!(Ludmila)
Mãe!
Começo a ler seu livro e começo a chorar! Quantas tristezas os bisavós e avós enfrentaram! Mas graças a Deus ao menos eles sobreviveram. Sinto uma pena muito grande não ter podido conviver por mais tempo com os bisavós, mas tenho boas lembranças! Lembro-me, mãe, do bisavô fazendo as velas! E sempre vestindo uma túnica preta! Os pãezinhos da igreja também! Como eram gostosos! E os panetones todos enfeitados, acho que com glacê, no qual grudavam bolinhas bem miudinhas coloridas! Quando ele ia lá em casa, com um incensário, e nos benzia, e a casa também. Da bisavó lembro, como se fosse hoje, que quando ficava lá ela nos colocava, eu e o Sérgio, para rezarmos em russo, e depois ela molhava o dedo no óleo do incenso e fazia o sinal da cruz em nossas testas! E ela não falava português. Lembro-me do quarto que ela dormia, que ficava juntamente com os outros dois quartos no andar de cima, bem em frente à escada. Lá tinha duas camas, e creio que uma delas era do bisavô, que deve ter morrido antes dela, pois vovó Olga nos colocava para dormir lá, um em cada lado da cama, e no meio, colocava um saco de água quente para aquecermos nossos pés, traduzindo historinhas russas até pegarmos no sono! Ah! Também tinha um endredon branco de penas, que de tão quente, só ele bastava!
Lembro-me também do bisavô celebrando missa…acho que ele falava alguma coisa como:* “góspede spaciulus…góspede spaciulus…góspede spaciulus” (rsrs)…apesar de não entender o que falava, gostava muito porque era toda com uma fala cantada! E aqueles ícones, as velas acesas, uma igreja que me trazia muita beleza e paz. E tinha também o coral! Neste, lembro-me do vovô Dieda cantando.
Veio à lembrança também o quarto da Babuska…lá tinha uma cômoda com gavetões, e em cima lembro-me de um ovo de madeira tipo caixinha e do broche que ela me deu que guardava na primeira gaveta. Guardo a sete chaves este broche! Meu maior tesouro!
Todas essas lembranças vêm à tona por causa da leitura do seu livro!
Mãe, que aula de história é o Tempo Submerso! Você é muito boa nisso! Lembro-me também de inúmeras vezes que sentava comigo para estudar história! Se não fosse por isso…ai ai ai… Obrigada, mãe, por trazer tão boas lembranças, mesmo que num enredo de tanto sofrimento!
Apesar de no desfecho do livro relatar não ter encontrado o nome dos nossos nos registros dos cruelmente assassinados, trouxe à tona uma verdade que poucos conhecem, de russos matando os próprios russos. Que horror! E não honrou apenas as memórias dos nossos parentes, mas de todos aqueles que morreram sem culpa, ou mesmo direito de defesa, no mais profundo anonimato.
Só tenho que te parabenizar e Te Amar ainda mais por mais este trabalho.
Luca
*A ladaínha era: Góspodi Pamilui…Góspode pamilui, tradizindo:Graças a Deus! 

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